Telefonema entre Serra e Mendes gera tensão na corte
Fonte: Congresso em Foco
O fato de que o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes pediu vista de um processo em julgamento no plenário após receber um telefonema do candidato do PSDB à Presidência, José Serra, deixou novamente o STF sob tensão. Logo no início da sessão, Mendes viu-se obrigado a se manifestar sobre o caso. "Hoje me surpreendi com notícias que de que meu pedido de vista fora ocasionado por motivação político-partidário. Obviamente isso improcede em toda a extensão", afirmou.
E para rebater as acusações afirmou que o PT, que apoiou a mudança na lei no Congresso, tentou se valer do STF para levar adiante suas pretensões políticas. "Chamo a atenção para o viés político desta propositura e, mais ainda, para o risco que esta corte corre de, sem se aperceber de detalhes do jogo político, ser manuseada na busca deste ou daquele interesse eleitoral. O fato de o partido querer alcançar um objetivo político é legítimo. O que a corte não pode é se deixar manipular", disse. Depois, no intervalo da sessão, Mendes negou ter conversado com Serra.
Segundo reportagem de ontem do jornal Folha de S. Paulo, Serra ligou para o amigo Gilmar Mendes e o chamou "meu presidente". "O Serra não me chama de meu presidente. Chama de Gilmar. Vão ficar patrulhando com quem a gente fala?", completou. Mendes já havia deixado os ministros surpresos neste caso. Na sessão secreta de terça-feira, ante a ameaça de um pedido de vista, ministros relataram que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Ricardo Lewandowski, teria se proposto a flexibilizar a regra por meio de uma resolução do TSE. Mendes teria reagido à proposta, dizendo que o DEM logo entraria com um processo contra essa resolução.
O comportamento de Mendes praticamente sepultou a proposta do presidente do STF, Cezar Peluso, de promover reuniões reservadas antes de julgamentos polêmicos ou em momentos de crise para evitar conflitos em plenário. Na terça-feira, Peluso convocou os ministros e pediu que evitassem votos longos e polêmicas no plenário. Não queria que o tribunal fosse alvo de novos ataques depois do impasse criado no julgamento da validade da Lei da Ficha Limpa. Os ministros anuíram. Mendes, que estava na reunião, descumpriu o acordo.
Jurista cogita impeachment de Gilmar Mendes
Jurista e professor de Direito, Wálter Fanganiello Maierovitch disse no seu blog que reportagem da Folha de S. Paulo - na qual diz que o ministro Gilmar Mendes, do STF, recebeu telefonema do tucano José Serra antes de interromper o julgamento sobre a exigência de dois documentos para votar - causou "perplexidade" na corte. "Já se fala, mas não se sabe se é o momento adequado, no impeachment do ministro Gilmar Mendes. É o que ecoa a ‘rádio corredor’ do Supremo, caso seja comprovada a denúncia", escreveu. "O fato é grave porque coloca em jogo o direito de cidadania. Trata-se de um ministro do Supremo, que tem como obrigação a isenção."
Especialistas veem 'imoralidade' em ato de ministro
"É uma imoralidade, mas desgraçadamente faz parte dessa nossa história de privilégios", protestou ontem o jurista Luiz Flávio Gomes, referindo-se ao telefonema que o candidato à Presidência José Serra (PSDB) fez a Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), quarta-feira, antes que o ministro interrompesse julgamento do recurso do PT contra a obrigatoriedade de o eleitor exibir dois documentos na hora do voto.
Para Gomes, "juiz não tinha que estar sujeito a esse tipo de telefonema no último minuto do jogo". Ele diz que "é normal o político tentar "enquadrar" juízes, mas nem sempre consegue, nem sempre os juízes se dobram a essas reivindicações que podem ser legítimas ou não". "Nesse item o PSDB perdeu feio", observa o advogado, ex-juiz de Direito.
O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Mozart Valadares, avalia que o caso é uma boa oportunidade para o País rever o modelo de composição do STF e dos outros tribunais superiores -Tribunal Superior do Trabalho, Superior Tribunal de Justiça e Superior Tribunal Militar. As quatro cortes contam 86 ministros. "O presidente Lula nomeou mais de 60 ministros em seus dois mandatos", assinala Valadares.
"Se tiver havido o telefonema com esse propósito evidentemente preocupa muito na medida em que poderia pairar dúvida a respeito de como as decisões são tomadas nos tribunais", disse o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante. "O ministro Gilmar pode ter sido alertado para que examinasse melhor a questão, apenas isso", acredita Carlos Velloso, ex-ministro do STF.
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sexta-feira, 1 de outubro de 2010
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